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ARMADILHAS DA TERCEIRIZAÇÃO


Apresentado como meio de regulamentar a terceirização no Brasil, movimentos sociais denunciam o projeto de lei 4.330/2004 como mais uma forma de atacar os direitos dos trabalhadores e diminuir salários. Estudos revelam o repasse cada vez mais comum de setores de empresas e do Estado para a iniciativa privada. Porém, diante dos efeitos negativos e desastrosos da terceirização, as mobilizações promovidas pelo movimento sindical têm se apresentado insuficientes para impedir o aumento dos ataques aos direitos trabalhistas.

De autoria do deputado Sandro Mabel (PMDB-GO), o projeto busca permitir a contratação de trabalhadores terceirizados para qualquer função, até mesmo para a atividade fim da empresa. Além disso, legaliza a diferença salarial entre contratados diretos e indiretos, tratamento repetido com vários outros itens das leis do trabalho.

Se o projeto de lei fosse aprovado, haveria consequências em todos os níveis, com destaque especial para o setor público. De acordo com a reportagem “Terceirização avança sobre direitos trabalhistas”, divulgada em fevereiro de 2012 pela Caros Amigos, a terceirização no setor público “avança com força, em todas as esferas de poder, e nas grandes empresas estatais, como Petrobras e Banco do Brasil”.

Pesquisa do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese), realizada em 2011, revelou dados alarmantes sobre o trabalho terceirizado. Existem pelo menos 10 milhões desses trabalhadores no Brasil, representando pelo menos 25,5% do mercado de trabalho formal. Recebem em média 27,1% menos, trabalham três horas a mais de jornada semanal e permanecem 2,6 anos a menos no emprego do que um contratado diretamente. A mesma pesquisa mostra oito em cada dez acidentes acontecendo com terceirizados. Quando há morte, quatro em cada cinco são com prestadoras de serviço.

Ideologia empresarial

A ideia da terceirização surgiu depois da Segunda Guerra Mundial, junto com os novos modelos de produção industrial, como o toyotismo. Eles pregavam uma adaptação às demandas de mercados e vieram acompanhados por uma proposta de trabalhador multifuncional, o qual deveria ter autonomia e iniciativa para aumentar sua produtividade.

Segundo o artigo “Críticas à ideologia da terceirização”, da pesquisadora Marília Portela Barbosa, nesse contexto surge o fenômeno da terceirização. Além de mudar a estrutura de como as mercadorias eram produzidas, modelos como o toyotismo provocaram uma ideologia que pregava a diminuição dos direitos trabalhistas conquistados pelo movimento sindical. Essa ideologia passou a usar termos como “flexibilização” da legislação trabalhista para camuflar sua visão dos direitos sociais como entraves para o aumento de lucros.

Os primeiros decretos que trataram sobre a intermediação de mão-de-obra por empresa terceira no Brasil surgiram em 1966. Porém, será a partir dos anos 1980, em um contexto mundial de ataques trabalhistas, que a terceirização se tornará moda em terras tupiniquins. Como consequência, surgiram vários projetos de lei para beneficiar os empresários, sendo o mais agressivo deles apresentado pelo dono da fábrica de bolachas Mabel.

Luta dos movimentos sociais

Como resposta à ofensiva do setor patronal, os sindicatos e centrais passaram a debater e estudar os efeitos da terceirização. Dessa forma, em novembro de 2011 foi criado o “Fórum em Defesa dos Direitos dos Trabalhadores Ameaçados pela Terceirização”. Em manifesto divulgado em 2012, o Fórum sintetiza os resultados que observa: precarização, sofrimento, adoecimento e morte. Além disso, destaca efeitos como divisão e enfraquecimento da capacidade sindical de lutar por direitos e condições iguais de trabalho.

O projeto de lei de Mabel teve sua votação adiada em agosto, na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) da Câmara dos Deputados. Vigílias e atos localizados foram organizados pelas centrais sindicais para reabrir as negociações, com o objetivo de mudar partes do projeto. Apesar disso, entidades como o Sindicato dos Servidores Públicos de Joinville, Garuva e Itapoá (Sinsej) consideram negativo essas iniciativas articularem apenas dirigentes sindicais, enquanto os trabalhadores de base apenas aguardam o pior. Na avaliação do sindicato, é preciso organizar um amplo debate e mobilização sobre o tema, pautando o fim das terceirizações e não sua melhor aceitação. Há a previsão de que a PL 4.330/2004 seja colocada em votação novamente ainda este ano.

Johannes Halter